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quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Barca Velha 2004

Casa Ferreirinha Barca Velha 2004
Característica diferenciadora: Opulência, equilíbrio, intensidade. Majestosa harmonia.

Preço: 200€

Onde: Garrafeiras especializadas e restauração

Nota pessoal: 19.5


Comentário:  Escrever sobre a experiência de beber Barca Velha é para mim sentido como uma responsabilidade e previlégio.
Não é uma referência mundial no mundo dos vinhos que custe 3 ou 4 ordenados mínimos nacionais como vários vinhos Franceses custam... Não cura doenças como muitos dos princípios activos aplicados na indústria farmacêutica...Mas é um símbolo de orgulho nacional.
É uma das marcas de maior retorno e awareness das quais nos podemos orgulhar, não por estruturas de marketing agressivas, mas por ser a prova viva do sonho de um Homem, cujo carisma permitiu que o seu objectivo fosse executado de forma exímia por outros Homens da sua época e perpetuado por décadas.
O sonho de Fernando Nicolau de Almeida de ter um vinho de mesa de referência em Portugal na década de 50, quando as uvas pagavam-se era a produzir vinho do Porto, concretizou-se em 1952. E continua vivo. Assenta o seu sucesso na procura da qualidade superior, acção de tentarmos fazer o melhor que sabemos e darmos tudo de nós nas pequenas coisas que fazemos para produzir este vinho. Não li em lado nenhum, mas imagino que seja assim o espirito. Eu tenho muito respeito e admiração... Muito mesmo, sobretudo por aqueles que ainda hoje acreditam e aplicam a metodologia necessária para exprimir de forma tão suprema a qualidade das uvas e o esforço "das gentes" para o produzire. Vénia.

Uma nota também para quem é responsável pelo acompanhamento enológico. É necessário ser-se muito humilde e extremamente competente para continuar a aventura de Fernando Nicolau de Almeida como José Maria Soares Franco fez e actualmente Luis Sottomayor continua. Seguramente cada um destes actores acrescentou e acrescenta um pouco da sua vida a este vinho, mantendo a tradição viva ao mesmo tempo que o respeito pelo terroir o mantém contemporãneo. E um reconhecimento também à Sogrape por respeitar os pergaminhos do Barca Velha e permitir que se continuem a produzir, investindo e respeitando a marca.

Dito isto, foi com muita satisfação que retirei uma garrafa de Barca Velha 2004 para estar presente na Ceia de Natal este ano. Satisfação e confesso algum receio. Acho que foi o meu presente de Natal a mim mesmo... que é partilhar com quem nos é mais próximo e querido.

Barca Velha impõe respeito... facilmente influencia opiniões só pelo rótulo, para o bem e para o mal... por isso mesmo e felizmente como cá em casa normalmente bebe-se bom vinho, independentemenmte da origem ou preço, não há a preocupação ansiogénica dos convivas de saber o que se vai beber... há um conforto e confiança que será bom e a seu tempo descortinar-se-á, sem estar no centro das atenções. Foi o que aconteceu.
Foi o 2º tinto a ser servido durante a Ceia de Natal. Naturalmente que depois de ouvir as reacções, no seguimento do vinho anterior de muita satisfação também, resolvi em jeito de comentário informar "olha, este é o Barca Velha de 2004 que ainda não tinha provado...", sem sofismas e com um franco sorriso de estar a partilhar o vinho com a família.
Mas confesso que existia o receio de o perfil do vinho ter mudado e não ser próximo daquele que em meu entender foi dos mais míticos anos que provei Barca Velha: 1995. É sem dúvida a minha referência.
Tinha receio que se tivesse alterado. Estava na realidade diferente em 1999 e o de 2000 só o provei uma vez. Mas este não estava diferente da minha referência de Barca Velha. Era apenas mais jovem este de 2004... mas para quem gosta, e eu tenho a sorte de gostar deste perfil, este tem tudo de Barca Velha. Fiquei feliz. Muito feliz.

Quem procura vinhos escuros e densos, aromaticamente exuberantes, não gaste dinheiro em Barca Velha. 
Pode comprar 5 ou 6 caixas de vinho com o preço duma garrafa e tem mais sensações de adrenalina. Aqui é mais serotonina.

Rubi muito bonito de opacidade média. Muito brilhante, lustroso.
Aroma Ferreirinha, mas ao contrário do que costuma ser mais "clássico", este está muito quente e envolvente...Mais do que é habitual. Guardo muito boas memórias de 1995... É o mais parecido, na minha opinião, com este. Ainda bem. Mas a minha experiência com Barca Velha é parca... Apesar da maravilhosa prova vertical que efectuamos há 4 anos atrás, essencialmente porque em redor das garrafas estava um bom grupo de amigos... mas de resto, só esporadicamente o bebo. Mas este imediatamente transportou-me para essa noite em que provámos 8 anos à mesa com 8 amigos.
Aromas de sedução pura, num misto de ervas quentes... aromas quentes de verão de alfazema. Extremamente delicado, profundo e especiado também. Nada de notas de álcool, muito persistente onde nada está em demasia nos aromas. Dá vontade de "aspirar" o vinho com o nariz... se tivesse de o efectuar alguma vez e pudesse escolher, era com Barca Velha que experimentava,
Falsamente evoluído na entrada de boca, pois a acidez está lá. Pimenta branca, muita largura na prova, estonteante para os sentidos. Tem muita largura e muito comprimento. É a forma mais coerente com que consigo descrever a sensação. Mineral qb mas leve como o mercúrio.
Verde ainda...no limiar de "estar a ficar maduro", à medida que respira, ganha jovialidade. Pujante apesar de usar cetim no toque, tenaz, crocante nos aromas, crepitante na boca. Potentíssimo. Fresquíssimo, final muito longo e crescente. Novíssimo. 

À medida que evolui, manifestam-se com maior destaque aromas e frescura de ervas aromáticas, estilo lavanda. Muito fresco. Muito fino, ao mesmo tempo que muito complexo. No limite do quase doce, mas duma tonicidade e capacidade de refrescar o palato impressionante. Perdoem algum discurso estilo telegráfico, mas o vinho é assim. De forma telegráfica, produz-nos sensações extremamente claras, clarividentes, e deliciosas... nunca usei, mas se comparasse com um telegrama, seguramente seriam boas notícias.
O que o distingue da grande maioria de grandes vinhos que produzimos em Portugal é que o vinho nunca cai durante a prova em momento nenhum. É como se fosse um motor (potente) dum carro, que disponibiliza a muita potência que tem, de forma sempre muito progressiva mas sempre potente, com binário desde a rotação mínimo até à máxima. No entanto, sem o mínimo solavanco. 

Sempre lato nas sensações que produz, vasto na persistência e muito, muito, muito equilibrado. Se atentarmos no pormenor de ter 9 anos... calibra-nos o nosso imaginário de longevidade nos vinhos. É impressionante.
Fruta vermelha densa, muita frescura balsâmica, especiado qb e os 16 meses de barrica que estagia... nem se dão por eles, tão plena que é a integração no vinho da barrica (75% barrica nova e 25% usada)
Na minha opinião ainda está a "arrefecer"... a "apurar"... vai seguramente melhorar muito nos próximos anos.
É talvez dos melhores Barca Velha que já bebi... Mas felizmente ainda não bebi muitos. Sou novo... Mal seria. 

Este lote segundo a informação que investiguei na ficha técnica é composta por 40% de Touriga Nacional, 30% Touriga Franca, 20% Tinta Roriz e 10% Tinto Cão. Escolhidas as melhores uvas de diferentes altitudes do Douro Superior, cachos colhidos à mão e desengace total. Vinificado na sofisticada adega da Quinta da Leda, seguiu todo o preceito como se pode imaginar de cuidado loteamento, provas obsessivas na busca dos melhores equilíbrios antes de engarrafadass, até que segue em descanso para lançamento no mercado onde é possível compreender o porquê de se provar colheitas sempre com mais de 7-8 anos, mas que resultam em tanta harmonia.As que não se aproximam da perfeição... ficam Reserva Especial! Que também não é nada, nada mau.

Acabei bem o difícil ano de 2013. Entro em 2014 a escrever para que seja bom prenúncio.

Provador: Mr. Wolf