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quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Quinta do Côtto Grande Escolha 1995


Característica diferenciadora: Grandiosidade.

Preço: 45€

Onde: Garrafeiras especializadas... e particulares.

Nota pessoal: 18


Comentário: Vinho absolutamente mítico da década de 90... símbolo de qualidade inquestionável, exímio estandarte dum perfil de Douro já transformado, de vinhos grandiosos, rústicos e cuja rusticidade só era aceitável em virtude de a qualidade ser extraordinária. 
Lembro-me perfeitamente da textura aveludada e ao mesmo tempo rústica que estes vinhos tinham. Bebi vários Quinta do Côtto (sem ser Grande Escolha) de 1997 que era fenomenal. Infelizmente hoje são diferentes. Felizmente ainda existem garrafas como esta, em excelentes condições para as provar!
Não era perfeito, nem tinha perfil para agradar a todos os consumidores... nada disso. Nem grandes preocupações relacionadas com preços... este, especialmente, era "caro como fogo"!
Era um vinhão, cheirava a vinho a sério e tinha muita força. Marcava a prova... lembro-me das sensações quando tive as oportunidades de as provar... só comparável, para mim, a alguns Tapado do Chaves antigos, também eles cheios de personalidade, marcantes, diferentes. Nostálgico e triste, quando provei  uma de 2001 e achei que nada tinha a ver com estes magníficos Grande Escolha da Quinta do Côtto...

Bom... temperatura adequada, rolha retirada com dificuldade... garrafa apontada ao copo. Cor de iodo escuro!

Nariz com fruta pisada, estranhamente a puxar para pêras e alguma fruta confitada.
Não está límpido nem cristalino. Longe disso. Está ligeiramente turvo com algumas notas metálicas, no nariz e na boca. Não é de todo um vinho perfeito, mas é dos defeitos que emerge o seu grande carácter.
Clássico, mineral, notas de couro e estevas secas. Muitas. Boca muito harmoniosa. Muito, muito, muito elegante. Não é para agradar a todos 18 anos depois... tal como em jovem. Pode ser pura e simplesmente ignorado, ou pode ser vinho de culto. Volto a repetir... Este, de 1995 está fiél a sim mesmo, grandioso e elegante. 
Final muito longo, fresco e com notas cítricas, espicaçadas por uma acidez ainda presente. Dá prazer beber? Dá!!! Muito! É bom? É!!! Muito.
Enerva pensar porque é que actualmente não há vinhos assim... 12,5% de graduação alcoólica, fiel ao ano e só terroir... Da região de Mesão Frio, que nem é das minhas preferidas do Douro. Mas é uma pena... Hoje em dia, os vinhos saem quase todos os anos iguais... Estes não! 
Mas quando saem (ou saíam) bem, são imortais. 
Muito especiado, entrada momentanea na boca ainda rude, mas final longuíssimo e persistentemente elegante. Nada enjoa, nada está em demasia. Bebe-se com prazer, sem nunca enjoar, pesar, nada... respeita-se o seu tempo e as suas limitações, e sabe muito bem, que é o que fica na memória... agora, como há 18 anos atrás.

Os meus parabéns caro Miguel. Gostava que conseguisse produzir na sua Quinta vinhos outra vez semelhantes e com este perfil.

Provador: Mr. Wolf

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Collares Viúva Gomes Reserva Tinto 1967


Característica diferenciadora: Um bocadinho de História de Portugal Vinícola.

Preço: Não aplicável.

Onde: Garrafeiras especializadas... e particulares.

Nota pessoal: 18.5


Comentário: Parece-me óbvio compreender o misto de excitação com apreensão com que se abre uma garrafa de 1967... excitação, pois estamos a falar duma garrafa que está fechada há mais anos que muitos de nós que lemos estas linhas... Pensar que quando esta garrafa foi engarrafada, não existiam por exemplo telemóveis... que viviamos em Portugal num regime governativo diferente... havia menos carros nas estradas dum concelho como o que vivo, do que provavelmente num parque dum centro comercial actualmente na semana do Natal...Beber isto é pensar que os carros não tinham injecção electrónica... Havia 2 canais... Nem sei se a cores. Havia menos carros que telefones fixos... Telemóveis, nem em sonhos. Um telecomando era só com uma fisga. Percebem a excitação? Excitação também pela curiosidade natural que temos em analisar como estará 46 anos após ser "feito vinho"... excitação, por ser de Collares... a apreensão advém apenas do facto de poder estar "morto" e imbebível!

Bom... Abra-se! Rolha escura, ligeiramente húmida... dificil... mas saiu... aos bocados, mas saiu!

Cor incrivelmente rubi!  Ligeiros laivos atijolados, mas predominantemente rubi.
Aromas iniciais de armazém de produtos químicos... Aromas de laboratório de físico-química das aulas do secundário! Pelo menos da escola que frequentei... e não era por terem lá garrafeira. Não é mofo, nem antigo... Nem madeira encerada... É químico. 
Decanta-se. Respira.

1 hora depois:

Notas florais, muito a lembrar rosas. Aroma da água das rosas explícito. Aquela água no dia em que se colocam rosas em jarra numa sala! Uau. 46 anos! Estou estupefacto...

Prova de boca... tal é a curiosidade suscitada, que quase que se fala mais baixo para provar este vinho!
Acidez marcada, com notas metálicas muito evidentes e mineralidade. No entanto é perversamente elegante e equilibrado dando uma prova muito homogenea.
Fruta? Zero. Nem vê-la nem cheirá-la!! Nem sequer se imagina que um vinho pode ter fruta depois de andar a namorar os aromas deste copo. Fruta para quê?? Nadinha! Se muito, pois o nosso cérebro prega-nos destas partidas e procura referências que conheça e consiga indexar, encontramos lima na prova de boca e na parte frontal da língua. É o mais frutado que se consegue...
Granular na língua, extremamente sedoso e por estranho que pareça parece não ter tanino nenhum, mas a acidez é de tal forma peculiar que o tanino não faz falta. 
Volta e mais volta no copo e emergem aromas de algas, aquele aroma matinal quando a maré está vazia ... aroma de amanhecer e caminhar perto do mar. Pelo menos é o que me lembra... caminhar no Paredão entre Cascais e S. João. Iodo ligeiro e muitas algas. Prova de boca consistente com sabor ligeiramente salgado.

Provar este vinho, lança-me para reflexões sobre a dureza com que estás uvas crescem, atlânticas, em solos arenosos... Literalmente arenosos, sem "mariquices" e apenas o essencial para que não sucumbam aos agrestes ventos e às humidades excessivas deste terroir... Infância e adolescência difícil, rude... E tal como no homem, com necessidades mas educação, produzem a idade adulta de sucesso, com personalidade e carácter majestoso. É o que este vinho é.
São 46 anos e o vinho está vivíssimo. Em prova cega, nunca, mas nunca diria que tem mais do que 20 ou 25 anos... É só de 1967...

E ele repousou, passou revoluções, emancipações, ciclos políticos e económicos e aqui aparece, do meio do nada, engomado, distinto e pronto para provas e avaliações de qualidade! 
Impensável comparar com o que se faz... É comparar um alfaiate tradicional com a Zara...e a Zara seguramente tem mais sucesso actualmente que o tradicional alfaiate. Dá que pensar. 
Acidez estonteantemente elegante. É ácido, mineral mas muito sedoso. A língua ressente-se mas fica com uma rudeza muito fina, muito salivar e extremamente gastronômica. Vinho para sonhar. 

Provador: Mr. Wolf